Publicado em: 00/00/0000
A
observação de jogadores tem, hoje, objetivos diferentes do que há uns anos
atrás. Agora, quando um ‘observador’ é enviado para ver alguém, já sabe
praticamente tudo sobre o alvo em questão, como joga, quais os pontos fortes e
fracos. Já não se trata de saber se o jogador é bom ou mau, mas de
percebê-lo, analisá-lo, estudá-lo para além do que está visível. Se o
objetivo principal do ‘Scouting’ é selecionar, uma parte desse trabalho já não
exige olho humano. As estatísticas fazem – e farão ainda mais no futuro – a
primeira triagem. Depois, é preciso vê-los jogar e isso pode ser feito via
televisão ou através de diversas plataformas que transmitem os jogos. E só após
estes episódios, é que as observações ao vivo são inseridas no recrutamento.
Mas se já se sabe como ele joga, o que faz, quantos e que tipo de passes faz,
se corre muito ou pouco, bem ou mal, se se enquadra na equipe, o que resta para
observar? Esta última etapa do processo de ‘scouting’ tende, assim, a não
ter tanto a ver com futebol e nesse sentido exige e exigirá, cada vez mais,
competências, olhares e abordagens diferentes de quem tem a
responsabilidade de dar o aval (muitas vezes definitivo) se determinado jogador
tem, ou não, o que é preciso para ser validado. Não é o perfil futebolístico
que está em causa, esse já foi traçado; é o perfil humano, pessoal,
comportamental e mental que merece a maior atenção quando as observações são ao
vivo. Deste modo, os ‘scouts’ do presente, mas principalmente do
futuro, não bastará perceber muito de futebol – isso será um
acrescento de valor, um fator diferenciador. A formação terá que ser muito
mais ampla e holística, e integrar conhecimentos mais profundos em áreas
relacionadas com psicologia, comunicação, relações humanas, linguagem
comportamental. Nas observações ao vivo já não é o jogador que está em análise,
mas o homem, o companheiro, o membro da equipe, o motivador, o líder. As
estatísticas e o jogo resumem o que o jogador faz, e isso pode ser percebido
sem ser necessário ir ao campo; mas não dizem como ele se comporta, como reage,
como aguenta a pressão, como responde às adversidades, como respeita e como
trata treinadores, companheiros de equipe e adversários, tudo isto, que é muito
relevante, apenas é perceptível ao vivo. Numa altura em que o ‘scouting’ é
– e bem – cada vez mais levado a sério, é importante perceber que o seu raio de
ação e trabalho pode, e deve ser, cada vez mais abrangente e que as suas
qualidades e competência têm que se tornar mais variadas, mais holísticas e
mais detalhadas. Por isso, os departamentos precisam de mais conhecimentos, de
outras visões, trazendo mais áreas para esse processo. Apesar de tudo isso,
o que é relacionado com desenvolvimento pessoal, poder e deve ser incutido,
trabalhado e melhorado, é muito melhor quando se encontra alguém já pré-determinado
nesse sentido. O mais difícil não é ver nem perceber se alguém tem
qualidade para jogar futebol, o complicado é perceber se tem o que é preciso
para se sujeitar aos sacrifícios, às adversidades, à exigência para atingir
patamares mais altos. Tem toda lógica investir em observadores com
capacidade e conhecimento para ir além na análise do que a meramente
futebolística, mesmo que essa abordagem, a de perceber comportamentos e
atitudes, não seja prioridade até um certo ponto. Acredito que a
introdução e o desenvolvimento do ‘Big Data’ vão, paradoxalmente, exigir mais
dos clubes, das equipas e das organizações ao nível humano. Mais
conhecimento, sobretudo, mas também mais profundidade e menos superficialidade,
mais diversidade de conteúdos, mais atenção aos detalhes, mais cuidado nos
relacionamentos, etc. E é preciso preparar, potenciar e ajustar as pessoas a
esse contexto. No futebol de hoje, e do futuro, a tecnologia faz coisas
que antes estavam nas mãos de pessoas, logo as pessoas precisam de acrescentar
outro valor e serem capazes de coisas que as máquinas não fazem.